Surdez: uma questão de cultura e cidadania

Por Alisson Paiva e Luiz Nemer

 

Arlindo da Silva Dias é surdo desde criança. Hoje participa como instrutor de Libras (Língua Brasileira de Sinais) no Projeto Matemática e Surdez: Questão de Linguagem e Novas Técnicas de Ensino do Departamento de Matemática da UFV, que tem como principal finalidade mostrar à sociedade a importância da LIBRAS e a necessidade de sua  inclusão no sistema educacional do Brasil.

Os problemas enfrentados por Arlindo ainda são muitos, mas no passado já foram piores. Desde criança, quando já não possuía o sentido da audição, precisava se comunicar com as outras pessoas, porém essas não eram capazes para isso. Enquanto estava na escola, por exemplo, teve dificuldades devido a falta de capacitação de seus professores para lidar com sua surdez.

Este projeto foi criado por Wanderley Nunes do Nascimento em 2007, quando nasceu a equipe do “Matemática e Surdez”. Eles oferecem cursos de libras abertos a todos os interessados, e ainda realizam visitas em algumas escolas da rede pública viçosense a fim de ensinar matemática para os estudantes surdos. O criador conta que a idéia nasceu de uma experiência por ele vivenciada em um de seus trabalhos como tradutor de LIBRAS.

Segundo a professora Lucy Tiemi Takahashi, coordenadora do projeto, o aprendizado da matemática torna-se mais complicado para os surdos uma vez que eles possuem certa dificuldade em relacionar o símbolo (1, 2, 3...) à quantidade que ele representa. Por isso são utilizados materiais lúdicos para facilitar a aprendizagem.

Os participantes do projeto ressaltaram a importância de que os surdos tenham uma educação normal, capacitados a falar e entender os sinais. As famílias super-protetoras, que preferem isolar seus filhos surdos, provocam um isolamento destes cidadãos na sociedade. Outras, não sabem lidar com esse tipo de situação e acabam os abandonando.

O instrutor Arlindo teve que passar por diversas situações em sua vida, que lhe fez enxergar a necessidade da LIBRAS ser conhecida pela sociedade. É fundamental que todos estejam aptos a se comunicar independente das diferenças. Muito do que hoje está enraizado em nossa cultura de preconceito, veio em decorrência dessa “não comunicação” também por parte de quem não possui alguma deficiência.

Arlindo conta que conforme foi desenvolvendo suas capacidades e superando as diferenças sócio-estruturais, foi possível seguir seus estudos até o segundo grau, conseguir um emprego e levar uma vida normal. O curso de libras do Projeto tem também a finalidade de passar para os alunos a idéia de que é importante que todos saibam a língua dos sinais a fim de diminuir essa brecha que há entre ouvintes e surdos. Ele ressalta ainda que durante toda sua vida, pode perceber o quanto a nossa sociedade ainda não está preparada para dar condições de acessibilidade a todos. Os surdos passam por muitas dificuldades ao lidar com diversos tipos de serviços, na rua, em prédios e órgão públicos.

Em 24 de Abril 2002 o Governo Federal promulgou a Lei nº 10.436, que diz que todos os cursos de licenciatura devem oferecer em sua grade a LIBRAS, para que os futuros professores sejam capacitados a lidar com os alunos surdos. Em Viçosa ainda não foram tomadas providências e o Projeto também discute sobre isso. Segundo Maria da Penha Basílio, atual chefe do Departamento de Ensino Infantil da prefeitura de Viçosa, há um grande abismo entre a criação de uma lei e a sua prática.

Lucy fala ainda do interesse em se promover a divulgação deste projeto para que haja uma aceitação da sociedade, possibilitando assim a troca de conhecimentos e culturas, respeitando e aprendendo com as peculiaridades de cada um. Ela destaca que a intenção do projeto não é “ensinar” LIBRAS, e sim divulgá-la, perpassando todo o contexto histórico-cultural da LIBRAS e dos surdos, além de dar auxílio didático em matemática a estudantes surdos, trabalho feito atualmente por Valteir R. Cristino, bolsista PIBEX em 2008, e Izabela F. de Oliveira, voluntária do Projeto, contribuindo assim para a melhoria do seu ensino e aprendizagem.

É fundamental que a sociedade entenda e se sensibilize com a condição destas pessoas, a fim de que todos nós nos prontifiquemos a aprender a língua de sinais e possamos nos comunicar em iguais condições com todos, sem distinção. Para que não seja necessário um intérprete toda vez que um surdo precisar se comunicar com alguém, como foi o caso de nossa entrevista com Arlindo.

O primeiro módulo do curso de LIBRAS teve duas edições: uma em abril e outra em setembro de 2008, e volta em 2009. Num segundo módulo, a ser oferecido em 2009, será trabalhada a gramática da língua. Lembrando que é aberto a toda a comunidade e que para participar da segunda parte, é necessário ter um conhecimento básico da língua. As aulas acontecem no campus da UFV, geralmente no próprio Departamento de Matemática ou então nas salas do Centro de Ensino e Extensão (CEE).

 
CCOM - Curso de Comunicação Social